segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E MITIGAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 24


Processo Penal – Instauração de Inquérito Policial e Ação Penal nos CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E MITIGAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE 24.

Marcelo Daemon
10/01/2012

No dia 2 de dezembro de 2009, o Supremo Tribunal Federal (STF), no uso de suas prerrogativas constitucionais editava a súmula vinculante 24, sedimentando seu entendimento acerca da formação dos elementos materiais (elementos normativos do tipo) dos crimes previstos no Art. 1º, incisos I a IV da lei 8.137/90 a qual reproduzimos: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1o, incisos I a IV, da Lei no 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.”.

Da leitura da súmula, verifica-se que para o STF, a constituição definitiva é elemento normativo do tipo penal. Contudo, para o STJ (questão recente da banca CESPE/UNB – concurso para o cargo de Juiz Federal Substituto da 3ª Região/ 2011, questão ainda em fase de recurso – gabarito provisório) a exigência de lançamento é condição objetiva de punibilidade. Na prática, o STJ apenas entende que o tipo está aperfeiçoado, mas a atividade persecutória em matéria criminal (inquérito policial ou ação penal) do estado só se torna legítima após o lançamento, quando surgiria o Jus Puniendi .
A construção do Pretório Excelso, acompanhada pelo Superior Tribunal de Justiça de que a instância administrativa fiscal deveria ser exaurida, vez que o delito não poderia ser apurado antes do lançamento definitivo (constituição do crédito em razão da Fazenda federal, estadual, distrital ou municipal), ocorre em conformidade com o Código Tributário Nacional, vez que apurar o valor devido à Fazenda Pública é atividade privativa da autoridade fiscal, não cabendo às Polícias ou ao Ministério Público fazê-lo: “Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa (grifo nosso) constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.”
Portanto, apesar das críticas embasadas nas distinções e independências das instâncias, a construção jurisprudencial feita pela Suprema Corte ampara-se no entendimento mais favorável ao acusado e principalmente na legalidade. Se a supressão ou redução do tributo compõem o tipo penal, consoante redação do Art. 1º, caput da lei 8.137/90, como tê-lo por configurado sem a constatação da efetiva redução ou supressão?
A questão vem sendo muito cobrada pelas bancas de concursos, mas é de compreensão simples e deve ser memorizada pelos candidatos no sentido de que não se admite o inquérito policial ou a ação penal antes da constituição definitiva do crétido tributário pelo fisco.
Ocorre que o próprio STF mitigou seu entendimento, por duas vezes, em hipóteses que poderão ser cobradas em provas de concursos públicos, vejamos:
1ª) Em caso de ser necessária a obtenção de quebra de sigilo bancário para acessar movimentação financeira de empresas ou pessoas físicas, por agentes de fiscalização que estão obstados de exercer seu mister em face de serem impedidos pelo contribuinte, que não disponibiliza tal documentação voluntariamente, HC 95443 SC, entendeu o STF ser possível a instauração de inquérito policial.
Lembre-se de que se trata de exceção, devendo estar a hipótese plenamente amparada pelos requisitos legais que amparam a violação de sigilo bancário (Lei complementar 105/2001:
HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL ANTES DO ENCERRAMENTO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO-FISCAL. POSSIBILIDADE QUANDO SE MOSTRAR IMPRESCINDÍVEL PARA VIABILIZAR A FISCALIZAÇÃO. ORDEM DENEGADA.
1. A questão posta no presente writ diz respeito à possibilidade de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do procedimento administrativo-fiscal.
2. O tema relacionado à necessidade do prévio encerramento do procedimento administrativo-fiscal para configuração dos crimes contra a ordem tributária, previstos no art. , da Lei nº 8.137/90, já foi objeto de aceso debate perante esta Corte, sendo o precedente mais conhecido o HC nº 81.611 .
3. A orientação que prevaleceu foi exatamente a de considerar a necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária (Lei nº 8.137/90, art. ). No mesmo sentido do precedente referido: HC 85.051/MG, rel. Min. Carlos Velloso, DJ 01.07.2005, HC 90.957/RJ, rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.10.2007 e HC 84.423/RJ, rel. Min. Carlos Britto, DJ 24.09.2004.
4. Entretanto, o caso concreto apresenta uma particularidade que afasta a aplicação dos precedentes mencionados.
5. Diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornou-se necessária a instauração de inquérito policial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, conseqüentemente, para a apuração de eventual débito tributário.
6. Deste modo, entendo possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo-fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização.
7. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.
2ª) Noticiada no recentíssimo informativo 650 do STF(HC 108037/ES), tratando do caso de conclusão do procedimento administrativo fiscal no curso de ação penal já instaurada, a decisão abre um precedente que ainda será analisado pelo plenário, vez que foi decisão de apenas uma turma.:
Crime tributário e oferecimento de denúncia antes da constituição definitiva do crédito tributário - 1

A 1ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que se pleiteava o trancamento de ação penal, ante a ausência de constituição definitiva do crédito tributário à época em que recebida a denúncia, por estar pendente de conclusão o procedimento administrativo-fiscal. Assentou-se que a Lei 8.137/90 não exigiria, para a configuração da prática criminosa, a necessidade de esgotar-se a via administrativa, condição imposta pela Constituição somente à justiça desportiva e ao processo referente ao dissídio coletivo, de competência da justiça do trabalho. Consignou-se que seria construção pretoriana a necessidade de exaurimento do processo administrativo-fiscal para ter-se a persecução criminal e que o Ministério Público imputara a prática criminosa concernente à omissão de informações em declarações do imposto de renda com base em auto de infração que resultara em crédito tributário. Portanto, descaberia potencializar a construção jurisprudencial a ponto de chegar-se, uma vez prolatada sentença condenatória — confirmada em âmbito recursal e transitada em julgado — ao alijamento respectivo, assentando a falta de justa causa.

Crime tributário e oferecimento de denúncia antes da constituição definitiva do crédito tributário - 2
O Min. Luiz Fux acrescentou que no curso da ação penal houvera a constituição definitiva do crédito tributário. Assim, aplicável o art. 462 do CPC (“Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a sentença”). Vencido o Min. Dias Toffoli, que concedia a ordem e aplicava a Súmula Vinculante 24 (“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”), em razão de a denúncia ter sido apresentada e recebida antes desse momento do processo administrativo.

Ambas as exceções devem ser fruto de cobrança nos próximos concursos devendo, portanto, ser memorizadas pelos candidatos.

Um forte abraço e bons estudos.

Marcelo Daemon é Delegado Federal
e professor dos Cursos Maxx e Ícone

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